O Observatório Latino-Americano de Sinodalidade apresenta o artigo “A Igreja local e a eleição de seus bispos: uma prática do sensus fidei”, escrito pelos teólogos Rafael Luciani e Serena Noceti, e publicado originalmente na revista Seminarios (Vol. 70, No. 235, 2024).
Este artigo oferece uma visão da evolução do processo de eleição episcopal na Igreja, analisando como ele mudou ao longo do tempo e como pode ser renovado à luz da sinodalidade.
Uma prática enraizada na história da Igreja
O artigo ressalta que, nos primeiros séculos do cristianismo, a eleição dos bispos não era um ato exclusivo da hierarquia, mas um processo que envolvia ativamente o povo de Deus. A comunidade desempenhou um papel central na seleção de seus pastores, refletindo uma eclesiologia de comunhão na qual o bispo era eleito com a participação do clero e dos leigos.
Este modelo garantiu que o ministério episcopal estivesse verdadeiramente enraizado na realidade pastoral de cada Igreja local. No entanto, com o tempo, esse modelo se transformou significativamente. Durante a Idade Média, a nomeação de bispos passou a ser controlada por grupos poderosos, desde monarcas até a Cúria Romana, reduzindo a participação do povo de Deus em um aspecto fundamental da vida da igreja.
O artigo de Luciani e Noceti nos convida a refletir sobre essa mudança e a questionar se o modelo atual realmente responde à visão do Concílio Vaticano II e ao chamado à sinodalidade.
Da participação comunitária à centralização do processo
Um dos aspectos mais marcantes da análise histórica é como a eleição dos bispos deixou de ser um processo participativo para se tornar uma prática cada vez mais centralizada.
Nos primeiros séculos, a comunidade discernia quem deveria ser seu pastor, seguindo um processo de consulta e votação do qual participavam clérigos e leigos. O bispo não foi imposto de fora, mas surgiu de dentro da própria Igreja local.
Entretanto, com o crescimento da Igreja e sua progressiva conexão com estruturas de poder, esse modelo mudou drasticamente. Durante a Idade Média, monarcas e outras autoridades civis começaram a influenciar a eleição de bispos, usando essas nomeações como uma ferramenta de controle político. Ao mesmo tempo, a própria hierarquia eclesiástica absorveu cada vez mais essa função, deslocando a voz da comunidade.
Esse processo culminou com o Concílio de Trento (século XVI), que consolidou um modelo em que a nomeação episcopal era praticamente reservada à Santa Sé. Desde então, a eleição dos bispos se tornou uma prerrogativa quase exclusiva do Papa e da Cúria Romana, com pouca ou nenhuma participação da Igreja local. Isso marcou uma ruptura definitiva com a prática dos primeiros séculos e com a ideia de que o bispo deveria ser eleito pela comunidade que ele deveria pastorear.
Um desafio para a sinodalidade hoje
O artigo de Luciani e Noceti fornece uma análise histórica e levanta questões sobre eventos atuais. Num momento em que a Igreja está redescobrindo a sinodalidade como princípio fundamental de sua vida e missão, é necessário perguntar se o atual modelo de eleição de bispos está alinhado com essa visão. É possível restaurar a participação do Povo de Deus neste processo sem comprometer a unidade e a comunhão eclesial?
Um dos desafios é encontrar formas de integrar o sensus fidei da comunidade na nomeação episcopal. A teologia do sensus fidei sustenta que todos os batizados possuem uma sensibilidade especial para discernir a verdade da fé e, portanto, sua voz deve ser ouvida nas decisões que afetam a vida da Igreja. Aplicar este princípio à eleição dos bispos significaria abrir espaços reais de consulta e participação, para além dos atuais mecanismos formais.
Este debate é particularmente relevante no contexto do Sínodo sobre Sinodalidade. A reflexão sobre a eleição de bispos não é um tópico isolado, mas sim parte de uma discussão mais ampla sobre como a Igreja toma decisões e exerce autoridade. A sinodalidade consiste em ouvir, mas também em garantir que a voz da comunidade tenha um impacto real nos processos eclesiais.
Acesse o texto completo e aprofunde-se na reflexão
O Observatório Latino-Americano de Sinodalidade convida todos os interessados na renovação eclesial a ler o artigo completo em seu site. Lá você encontrará uma análise detalhada da evolução histórica da eleição episcopal, bem como propostas para sua renovação a partir de uma perspectiva sinodal.
O texto também pode ser consultado em sua publicação original na revista Seminarios . Este artigo faz parte de uma edição dedicada à eleição dos bispos na Igreja, com contribuições de diversos especialistas em eclesiologia.
A eleição dos bispos é um ato que define o modo como a Igreja é e age. Recuperar uma maior participação comunitária neste processo é um desafio, mas também uma oportunidade para fortalecer a comunhão eclesial e responder melhor às necessidades pastorais de cada Igreja local.
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